As preocupações crescentes com a dívida corporativa brasileira se espalharam para a maior produtora de biocombustíveis do país, provocando forte queda nos títulos da Raízen (RAIZ4). Investidores reduziram exposição a emissores considerados arriscados na maior economia da América Latina após perdas em duas liquidações recentes.
Os bonds da Raízen, joint venture de açúcar e etanol controlada pela Shell e pelo conglomerado brasileiro Cosan (CSAN3), recuaram quase 19% na última semana, com os papéis de US$ 1 bilhão com vencimento em 2035 atingindo mínimas históricas. Nesta terça-feira (14), os títulos recuperaram parte das perdas, subindo mais de 4 centavos por dólar e registrando rendimento em torno de 9% às 12h.
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Antes símbolo da força do agronegócio brasileiro, a Raízen enfrenta custos crescentes, safras ruins e apostas, do etanol de biomassa ao combustível de aviação sustentável, que ainda não deram retorno. Agora, operadores se afastam da empresa, temendo repetir prejuízos recentes com os papéis da Ambipar (AMBP3), do setor de resíduos, e da petroquímica Braskem (BRKM5).
Embora as companhias brasileiras enfrentem a taxa básica de juros de 15%, o alto endividamento torna a Raízen um dos principais alvos de investidores que buscam reduzir exposição a empresas consideradas vulneráveis. A tensão é agravada pelos problemas do Banco Master, que busca novo capital após se expor demais a ativos de risco.
“Os investidores estão muito nervosos, preferindo atirar primeiro e fazer perguntas depois ao menor sinal de dificuldade”, disse Ian McCall, sócio da First Geneva Capital Partners.
As turbulências no Brasil têm se repetido em outros mercados emergentes, como a Turquia, revelando fissuras após um período de forte desempenho do setor. Títulos corporativos brasileiros lideraram as perdas entre emergentes no último mês, com queda de 7%, enquanto um índice mais amplo recuou 0,5%.
A Raízen consumiu um caixa de R$ 7 bilhões nos três meses encerrados em 30 de junho. A dívida líquida aumentou 56% em relação ao ano anterior, para R$ 49,2 bilhões. O custo de serviço da dívida somou R$ 1,62 bilhão, o equivalente a cerca de 86% do lucro antes de juros e impostos no período.
Em comunicado divulgado na sexta-feira (10), a Raízen afirmou não ter planos de reestruturar sua dívida, destacando uma “posição de caixa robusta” de R$ 15,7 bilhões. A empresa, que também tem acesso a US$ 1 bilhão em linhas de crédito rotativo, disse ainda que as discussões sobre uma capitalização estão em andamento. A companhia não comentou além do comunicado.
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Mesmo assim, as declarações podem não bastar para acalmar investidores mais avessos ao risco. As quedas recentes de Ambipar e Braskem mudaram o sentimento do mercado, com investidores reprecificando o risco e questionando quem será o próximo alvo, disse Luiz Felipe Scalercio, chefe de pesquisa de crédito do BCP no Brasil.
As últimas crises levaram a Fitch Ratings a comparar o momento com o início de 2023, quando o colapso da Americanas paralisou o mercado de dívida corporativa, mostrando como o humor pode mudar rapidamente.
“Raízen — e muitas outras empresas brasileiras — insiste em sua liquidez sólida, mas os investidores estão olhando além do balanço e focando no fluxo de caixa”, disse Juan Manuel Patiño, analista da Sun Capital Valores. “Depois do caso Braskem, a narrativa de ‘forte posição de caixa’ já não convence, a credibilidade agora depende de geração sustentável de caixa livre.”
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Embora a Raízen tenha vendido ativos para reduzir a alavancagem, investidores duvidam que isso seja suficiente para melhorar seus indicadores, segundo McCall, da First Geneva Capital Partners. Em agosto, a empresa informou estar em “negociações ativas” para uma injeção de capital, mas ainda não revelou avanços. A Cosan já descartou novos aportes na controlada.
A Raízen mantém grau de investimento apesar da turbulência. A dívida da empresa tem rating “BBB” pela Fitch Ratings e pela S&P Global Ratings, dois níveis acima do grau especulativo, mas ambas as agências mantêm perspectiva negativa.
“As principais questões dizem respeito à extensão e duração desse cenário, por quanto tempo a Raízen ficará com alavancagem elevada, com índices acima de 2,5x–3x, e como isso pode afetar seus indicadores”, disse Flávia Bedran, analista da S&P. “Colocamos perspectiva negativa em janeiro, e se a alavancagem continuar alta por 12 a 18 meses, podemos tomar uma ação de rating”, afirmou.
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McCall disse que sua gestora normalmente não investiria na Raízen por ser um papel de grau de investimento com baixo rendimento, mas está reconsiderando após a forte desvalorização.
“Ficou barata de repente”, afirmou. “A Raízen está entrando no território de high yield.”
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