Um novo relatório da Organização Mundial da Saúde, lançado nesta terça-feira, aponta que condições neurológicas afetam 42% da população mundial, o equivalente a 3,4 bilhões de pessoas. Esse percentual chega a ser de 49,6% na Europa e 48,1% nas Américas. Além disso, o documento mostra que os diagnósticos são responsáveis por 11,8 milhões de mortes globalmente a cada ano.
“Com mais de 1 em cada 3 pessoas no mundo vivendo com condições que afetam o cérebro, precisamos fazer tudo que pudermos para melhorar o atendimento que elas necessitam”, diz, em nota, Jeremy Farrar, diretor-assistente geral da divisão de Promoção da Saúde, Prevenção e Controle de Doenças da OMS.
“Muitas dessas condições neurológicas podem ser prevenidas ou tratadas de forma eficaz, mas os serviços ainda estão fora do alcance da maioria — especialmente em áreas rurais e desassistidas — onde as pessoas frequentemente enfrentam estigma, exclusão social e dificuldades financeiras”, continua.
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O relatório usou dados de 2021 do Estudo Carga Global de Doenças (GBD), Estudo de Lesões e Fatores de Risco e de uma colaboração recente com o Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde para quantificar a perda de saúde relacionada às condições que acometem o sistema nervoso. Ao todo, foram considerados 37 diagnósticos, que vão da doença de Alzheimer até enxaquecas. São eles:
- Doença de Alzheimer e outras demências
- Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH)
- Transtornos do espectro autista
- Malária cerebral
- Comprometimento cognitivo ou síndrome de Guillain-Barré devido à Covid-19
- Neurosífilis congênita e adulta
- Neuropatia diabética
- Encefalite
- Epilepsia (idiopática)
- Epilepsia devido à equinococose
- Síndrome alcoólica fetal
- Síndrome de Guillain-Barré (SGB)
- Deficiência intelectual de desenvolvimento idiopática
- Meningite
- Enxaqueca
- Doença do neurônio motor
- Esclerose múltipla
- Encefalopatia neonatal
- Cânceres do sistema nervoso (SNC; neuroblastoma e outros tumores periféricos de células nervosas; a categoria inclui casos primários pediátricos e adultos, excluindo metástases)
- Defeitos do tubo neural
- Neurocisticercose
- Complicações neurológicas devido a defeitos congênitos de nascimento
- Complicações neurológicas devido à síndrome congênita do vírus Zika
- Complicações neurológicas devido à síndrome de Down
- Complicações neurológicas devido à síndrome de Klinefelter
- Complicações neurológicas devido a outras anomalias cromossômicas
- Complicações neurológicas devido à icterícia neonatal
- Complicações neurológicas devido à sepse neonatal
- Complicações neurológicas devido ao nascimento prematuro
- Outros distúrbios neurológicos (incluindo doenças degenerativas, distúrbios do sistema nervoso autônomo, distúrbios do movimento, doença espinocerebelar, distúrbios das raízes nervosas e plexos, distúrbios dos nervos periféricos, distúrbios neuromusculares e doenças musculares, como miopatias)
- Doença de Parkinson
- Raiva
- Lesão da medula espinhal
- Acidente vascular cerebral (AVC isquêmico, hemorragia subaracnoide, hemorragia intracerebral)
- Cefaleia tipo tensional
- Tétano
- Traumatismo cranioencefálico
Em relação a quadros de incapacidade e óbitos, as 10 condições que mais contribuíram foram: acidente vascular cerebral (AVC), encefalopatia neonatal, enxaqueca, doença de Alzheimer e outras demências, neuropatia diabética, meningite, epilepsia idiopática, complicações neurológicas relacionadas ao nascimento prematuro, transtornos do espectro autista e cânceres do sistema nervoso.
O relatório, o primeiro sobre questões neurológicas lançado pela OMS, destaca que apenas 53% dos Estados-Membros contribuíram para o estudo, o que revela a atenção limitada dada à neurologia pelos países. Além disso, apenas 32%, menos de 1 em cada 3, possuem uma política nacional voltada aos diagnósticos; 25% incluem distúrbios neurológicos na cobertura universal de saúde, e somente 18% relatam ter financiamento destinado a enfrentá-los.
O cenário também é desigual, com países de baixa renda registrando até 82 vezes menos neurologistas por 100 mil pessoas do que os de renda alta. O que faz com que, para muitos pacientes, “diagnóstico, tratamento e cuidados contínuos estejam simplesmente fora do alcance”, alerta a organização.
“Serviços críticos como unidades de AVC, neurologia pediátrica, reabilitação e cuidados paliativos frequentemente são escassos ou concentrados em áreas urbanas, deixando populações rurais e desassistidas sem acesso a cuidados que salvam e sustentam vidas”, afirma a OMS.
Em relação aos cuidadores, somente 46 dos 194 Estados-Membros oferecem serviços de apoio, e apenas 44 possuem proteções legais para eles. Essa realidade de falta de reconhecimento ou apoio reforça desigualdades sociais e impõe grande pressão financeira às famílias, segundo a instituição.
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No Brasil, dados do Relatório Nacional sobre a Demência no Brasil (ReNaDe), de 2024, mostram que 86% dos cuidadores são mulheres, e 83,6% são familiares. Em média, o tempo diário dedicado ao cuidado é de 10 horas e 12 minutos, sete dias por semana, sem qualquer apoio financeiro. Apesar da alta carga horária demandada, 65,7% dos cuidadores mantêm outro trabalho.
A OMS lembra que os Estados-Membros adotaram o Plano de ação global intersetorial sobre epilepsia e outros distúrbios neurológicos em 2022 com o objetivo de reduzir o impacto dessas condições. Neste contexto, a organização pede que os governos:
- tornem os distúrbios neurológicos uma prioridade política por meio de liderança corajosa e investimento sustentado;
- promovam a expansão do acesso ao cuidado neurológico por meio da cobertura de saúde universal e fortalecimento dos sistemas de saúde;
- promovam a saúde cerebral ao longo da vida com ações intersetoriais coordenadas, abordando fatores de risco e de proteção; e
- fortaleçam sistemas de dados e monitoramento para decisões baseadas em evidências e prestação de contas.